sexta-feira, 10 de abril de 2015

Demolidor - A Queda de Murdock

Miller e Mazzucchelli.
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O post poderia terminar por aqui, mas como eu não sei falar pouco, e eu demorei muito tempo pra resolver escrever sobre esta saga, cá estou eu sentado na frente desta tela, emocionado, por finalmente poder falar de uma das que eu considero uma obra prima dos quadrinhos, e que me fez crescer muito como ser humano, já que li isso ao final dos anos 80 na SAM e era a revista que eu não conseguia parar de esperar, mês a mês, pra ir buscar na banca enquanto não fechou a história.

A Queda de Murdock marcou a minha vida de tal forma, que até hoje eu lembro falas, narrativas, quadros e do sentimento. Sempre faço questão de falar sobre o sentimento, sobre a influencia que as HQ's exercem em nosso emocional. Se ela não te abalar emocionalmente e não te instigar mentalmente, ela está deixando passar uma oportunidade de ouro. 
Provavelmente voce já sabe desta HQ. Não poderei fugir de um spoiler ou outro durante o texto, mas se você não leu ainda esta edição tem dois motivos: Você começou a ler a pouco tempo ou você não é fã de quadrinhos. Mesmo que você goste ou não goste do Demolidor, tem que tirar o chapéu pra esta historia, que reune uma narrativa densa o tempo todo, cheia de nuances, de passagens psicológicas, reativas, levantando temas relevantes para a época como as drogas, os cartéis, gângsters e o lado humano do Matt Murdock. Quase não temos o Demolidor, é tudo centrado no Matt, no ser humano, na pessoa. Pessoa que sente, vive, respira, chora, come, dorme, machuca, pensa e sofre. E como sofre.
Deixa eu te situar um pouco no tempo. Antes desta saga, o Demolidor vivia num mundo florido, light... não tinha muita profundidade. Miller havia estado na revista a uns 7 anos antes e já  havia começado a colocar o estilo mais denso e sério, mas quando ele retornou pra escrever a Queda, ele veio pra detonar, pra mudar.
E como ele ja estava naquela energia do Cavaleiro das Trevas e outras publicações dele da mesma época, ficou mais evidente que ele gostava mesmo era de quebrar tudo. Sagazmente ele decidiu reposicionar o personagem, centrar ele numa guerra urbana, em um bairro simples, em um cotidiano mais próximo do chão, menos acrobático. Tudo se passando na Cozinha do Inferno, mas a realidade mesmo era que não importava. A Queda é do Murdock, não é do bairro, não é do Demolidor. A revista começa e termina com Matt. Demolidor demora pra entrar em cena e você não sente falta. Não sente...

A narrativa as vezes segue complexa e densa, te localizando, gerando o clima certo. Tem uma passagem que eu realmente adoro, que a gente fica cego com o Matt, que ele relembra como foi os primeiros momentos no hospital, os diálogos  os sons... tudo com muito sentimento, muito tocante. A gente emociona com ele, sente pena, sente a força dele surgir. A gente se torna o Demolidor, nascemos junto com ele. Depois, entram quadros e mais quadros de movimento. Movimento silencioso, com quadros que variam de tamanho... pequenos detalhes mostrados para intensificar grandes movimentos. Mazzucchelli fez algo admirável tamanho é a profundidade emocional dos personagens em um traço exageradamente limpo. Acho isso formidável, uma qualidade. E a coloração clean, lisa, sem aquele monte de manchas para dar profundidade. HQ por HQ mesmo, comum na época pré-photoshop. A paleta das cores geram nuances que acompanham toda a trama de modo que se você apenas seguir a leitura sem atentar aos detalhes a condução do seu inconsciente é tão grande que você fica ofegante junto com ele após uma corrida, ou de olhos mareados, ou com um frio na barriga de medo nas cenas em que os personagens sente isso. As sequências de movimento são tão perfeitas que você desvia a cabeça pra não ficar no meio de uma porrada ou um chute. Seus dedos se quebram junto com os do repórter. Você perde a respiração junto com o policial estrangulado. Você sente a dependência quimica do Bazuca, e quando Murdock cai, você também cai.
A queda mesmo esta nas duas primeiras edições, depois vem a recuperação e termina com ele livre, recomeçando a vida. É um roteiro digno de filme. Juro. Alias, este post está sendo lançado hoje, junto com o lançamento mundial da série do Demolidor na Netflix de propósito. É a minha homenagem e desejo de que a série seja mesmo um sucesso.
Os pensamentos do Matt são um prazer a parte. Muito bem escritos. Eu gosto mais da primeira tradução, da SAM. É mais coesa e pra mim tem todo o fator nostálgico, admito. Mas os pensamentos dele, o diálogo interno, as conclusões... o limiar da loucura. E tem também o pensamento do Rei. Pensamento primoroso, de um grande vilão. Junto a tudo isso o contra-ponto que passou a ser muito usado com o DD, que é o demônio sempre sendo salvo pela igreja, alem de a própria mãe ser uma freira. O reencontro deles, a forma que ele descobre isso.
Tudo artístico, tudo perfeito. Não consigo ainda ver nesta obra a mão do marketing. O lance era fazer uma boa historia, com os personagens se revolucionando. Uma das maiores provas da grandeza desta saga é que mesmo fora do contexto temporal, ler ela hoje te toca do mesmo jeito. Sabe por quê ? Porque é uma historia humana. Não fica datada com tecnologia. Este é o toque magistral do Mestre Miller.
Nesta HQ aconteceu tanta coisa, tanta mudança... Ben Urich, JJJameson, Rei Do Crime, Franklin Nelson, Karen Page, Melvin Porter. E o mais legal, na minha opinião tem a melhor historia do Capitão América até hoje. Esta frase do Capitão, segurando a bandeira americana é muito marcante: " Não sou leal a nada, General... exceto ao sonho." Em determinado momento, o bairro da Cozinha do Inferno é bombardeada e os Vingadores precisam intervir: Um Soldado cuja voz poderia comandar um deus, e um deus cuja voz pode comandar o tempo. Todos se calam...". Grandioso !

Acho que vou parar aqui, pra que você possa ler ( ou reler ) a sua edição. Está na coleção Salvat.

Agradeço a oportunidade de escrever neste blog, reler esta edição me trouxe a mesma emoção de quando eu li a primeira vez. E agradeço a você que lê e conversa comigo através deste blog. Se você não vem aqui ler, provavelmente eu não escreveria.

Abraços do Quadrinheiro Véio !












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